Não é o intuito deste blog recomendar qualquer livro aleatório, né, afinal, temos aqui um blog que fala sobre o jornalismo e tudo mais. Mas estamos de férias da faculdade né? Eu sei que o jornalismo não tira férias, mas por enquanto eu tiro, e faço algumas leituras mais leves, justamente por saber o que me espera lá na frente.
Uma das grandes diversões que eu tenho na vida é andar por livrarias. Adoro, realmente, deve ser um mal que nasceu na minha infância. E com essa onda de super-livrarias, em que o cliente se sente praticamente na biblioteca de casa, me sinto muito à vontade para passar horas passeando. Numa dessas andanças, descobri o livro
Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino. O título já me chamou a atenção, é uma declaração de amor. Resolvi lançar mão de uma velha tática, ler duas páginas do livro pra ver o que eu achava.
Não foi preciso ler duas páginas. Comprei o livro, e simplesmente mergulhei nessa história de amor e loucura criada por Marçal de Aquino. Não tem como você não experimentar os sentimentos vividos pelo fotógrafo Cauby, saído de São Paulo para ganhar dinheiro na região do garimpo, no norte do país. Não tem como se compadecer da história de amor e frustração do velho Altino [ainda mais eu, que me identifiquei bastante com o seu fracasso amoroso, hehehehe], ou não imaginar a beleza sensual e controversa de Lavínia, alvo do amor, paixão e loucura de Cauby.
O livro brinca com o tempo de uma forma que eu sempre gostei muito, principalmente em filmes. Ele narra a história no presente, com spots do passado dos personagens, de como eles chegaram até aqui, porque decidiram ficar na cidade, pequenos vislumbres de como está a vida deles hoje. Um estilo meio
Brilho eterno de uma mente sem lembranças, em que aos poucos você vai descobrindo o que aconteceu com cada um.
Uma história de amor precisa necessariamente ter final feliz? E o que seria o tal "final feliz", que os enamorados tanto propagam? E essa história, que envolve amor, loucura, traição e violência, numa cidade vivendo a corrida pelo ouro, o que seria o final feliz num cenário como este?
"O que acontece é que, quando estou com você, eu me perdôo por todas as lutas que a vida venceu por pontos, e me esqueço completamente que gente como eu, no fim, acaba saindo mais cedo de bares, de brigas e de amores para não pagar a conta. Isso eu poderia ter dito a ela. Mas não disse.(...)
Vivíamos o fim da nossa história, mas só eu sabia disso. E não deixei transparecer. Conversamos amenidades por um tempo, relaxados, dentro do Corcel de Chang estacionado em frente da casa. O pastor voltaria de viagem naquele dia - e a possibilidade de que pudesse chegar a qualquer instante e nos surpreender ali não parecia afetar Lavínia. Antes de entrar, ela ainda terminou de me contar, em detalhes, uma longa história sobre a avó, sua amada avó. Estava descendo do carro com o mochilão verde-oliva, depois de me beijar no rosto, na hora em que perguntei:
Já pensou se ele descobre?
Lavínia ruminou a questão por um momento, junto com o chiclete que tinha na boca. Então fechou a porta do Corcel e se debruçou na janela, para me presentear com uma bola e, depois que a estourou, com uma revelação:
Não se preocupe. Ele sabe."
[trecho do livro "Eu Receberia As Piores Notícias Dos Seus Lindos Lábios, de Marçal Aquino, Cia. das Letras, 2005, 4ª edição, págs 154; 161-162]No mais, o autor ainda nos presenteia com trechos de um estudo sobre o amor, feito pelo professor Benjamin Schianberg. Gostei tanto de algumas das coisas que eu li sobre o tal estudo que fui pesquisar, obviamente, no pai Google, que tudo sabe, tudo viu. Pois o pai Google nunca soube, nunca viu nem ouviu falar desse tal Schianberg. Personagem criado por Aquino exclusivamente para estrelar as páginas do seu romance, Schianberg nos lança algumas pérolas sobre o amor, algumas das quais eu concordo e repasso para vocês.
"De acordo com o professor Schianberg (
op. cit.), não é possível determinar o momento exato em que uma pessoa se apaixona. Se fosse, ele afirma, bastaria um termômetro para comprovar sua teoria de que, nesse instante, a temperatura corporal se eleva vários graus. Uma febre, nossa única sequela divina. Schianberg diz mais: ao se apaixonar, um 'homem de sangue quente' experimenta o desamparo de sentir-se vulnerável. Ele não caçou; foi caçado"
"Queremos o que não podemos ter, diz o professor Schianberg, o mais obscuro dos filósofos do amor. É normal, saudável. O que diferencia uma pessoa de outra, ele acrescenta, é o
quanto cada um quer o que não pode ter. Nossa ração de poeira das estrelas."
"O trecho está grifado no livro. Nele, o professor Schianberg dá voz a Nietzsche - 'Há sempre um pouco de loucura no amor, mas há sempre um pouco de razão na loucura' -, para depois contestá-lo, lembrando que na loucura dos amores contrariados não há espaço nenhum para a razão, apenas para mais loucura."
"Em
O que vemos no mundo, aprecio o capítulo em que o professor Schianberg fala da primeira vez que despimos certas mulheres. Com algumas, é sempre a primeira vez, diz o lunático mestre. Não se deve ter pressa, ele ensina no capítulo intitulado 'Vestir e despir o mundo'. Olhando aquela mulher atravessar a rua na chuva, pensei: eu daria um dedo para arrancar o vestido verde que ela está usando. Um dedo não. Dois. (E acabei dando mais. Meus ossos, todos)."
[trecho do livro "Eu Receberia As Piores Notícias Dos Seus Lindos Lábios, de Marçal Aquino, Cia. das Letras, 2005, 4ª edição, págs 14-15; 22; 25-26]Se você está buscando um romance não convencional, desses em que eles se casam e são felizes para sempre, vale a leitura. Diferente daquelas histórias de amor em que todas as pessoas parecem normais [seja lá o que exatamente signifique "ser normal"], em que tudo conspira a favor do amor, e que você já imagina o final... um livro que me surpreendeu, mais do que eu esperava ser surpreendida.
[no dia que comprei este livro, achei algo que, assim que terminar de ler, vou dividir aqui com vocês também. por enquanto, fica a surpresa. Mas tem a ver com esse livro]