Acho que ainda não comecei a recomendar livros aqui neste blog. Que vergonha! Um blogue jornalístico teria que, por bom senso, indicar aos jovens leitores que ainda não têm certeza da profissão que pretendem, algum livro que possa ajudá-los a se decidir. Como minha amiga e colega de martírio Sirlene já adiantou em post passado, o jornalista e atualmente blogueiro Ricardo Noblat tem um livro muito recomendável para quem ainda tem dúvidas, e para quem tem todas as certezas: O que é ser jornalista.

O livro foi escrito pelo próprio Noblat para compor a série "O que é ser", da Editora Record. Eu particularmente nunca tinha ouvido falar do livro, foi Sirlene quem falou e emprestou o livro. Posso falar? Gostei muito, de saber algumas das histórias do homem [que, independente de você concordar ou não com a visão política dele, é um homem que viu muita coisa acontecer no país]. Ele é bem realista, mostra no livro as dores e delícias de quem escolhe o jornalismo. Mais do que uma profissão, um estilo de vida.

Gostei do que ele diz no livro a respeito da imparcialidade do jornalista. Escolhi esse trecho do livro para compartilhar com vocês [grifos meus]:

"É raro o jornalista que não derrapa com frequência na lei mais difícil de ser respeitada - a que o obriga a se manter neutro diante de qualquer situação. Há jornais norte-americanos que proíbem seus jornalistas de serem sócios de clubes e de investirem na Bolsa de Valores acima de determinada quantia. E se um dia estoura um escândalo no clube do qual o jornalista é sócio? Ele terá isenção para investigá-lo? Como explicar que um jornalista da área de economia ganhe muito dinheiro na Bolsa sem ter-se beneficiado de informações privilegiadas?
As exigências de jornais norteamericanos fazem sentido e sempre farão. Mas servem, no fim, para disfarçar o fato de que não há imprensa mais hipócrita do que a norteamericana. Porque ela se apresenta ao mundo como modelo de independência editorial a ser adotado onde quer que se cultivem os valores da democracia ao estilo ocidental. E, no entanto, serve em primeiro lugar não à sociedade, mas aos interesses dos grupos políticos e econômicos que ditam o destino dos Estados Unidos - e, por extensão, dos países que gravitam em sua órbita, ou seja, quase todos.
[...]
A neutralidade do jornalista diante de um fato é uma utopia a ser perseguida sem descanso, assim como a utopia de um mundo mais igualitário. Mas como ser neutro diante de atos de flagrante injustiça, por exemplo? Em meados de 2002, vi na porta de um shopping em Brasília um rapaz de pouco mais de 20 anos espancar um homem idoso porque ele entrou em um carro na companhia de uma moça loura. O rapaz pensou que a moça fosse sua namorada. Na época, eu dirigia a redação do Correio Braziliense. Publiquei a notícia sob o título "O Selvagem do Shopping".
A notícia limitou-se a contar o que testemunhei e a registrar o que disseram depois os personagens do episódio. Ocorre que, se eu tivesse respeitado a lei da neutralidade na hora de fazer o título, não poderia ter chamado de "selvagem" o jovem espancador. Um título neutro ficaria assim: "Jovem Espanca Velho na Saída do Shopping". Mas um título assim chamaria de fato a atenção dos leitores para o caráter bárbaro e gratuito do ato de agressão? Se o jovem agiu como um selvagem, por que não adjetivar de selvagem seu modo de agir?
[...]
Às favas todos os escrúpulos quando honestamente apuro fatos e quando tais fatos avalizam determinadas conclusões! Como jornalista, tenho obrigação de apresentá-los ao público - não de escamoteá-los ou distorcê-los a pretexto de ser isento e objetivo. O público que julgue meu trabalho. Ele pode me censurar com sua repulsa ou me premiar com seu respeito e assentimento. Se não serve para esclarecer, alertar, forjar consciências e contribuir para a construção de um mundo menos injusto e desigual, para que serve mesmo o jornalismo?"
[trecho do livro "O Que É Ser Jornalista", de Ricardo Noblat, editora Record, 2006, 3ª edição, páginas 38-41]

Claro que tem muitas coisas que Noblat fala no livro com as quais eu concordo, ou deixo de concordar. Eu gostaria de ter tido a oportunidade de acompanhar a carreira dele dentro do Correio Braziliense. Mas, à época, ainda não havia descoberto minha paixão pelo jornalismo. Ou pelas biografias.

É um livro gostoso de ler, com uma linguagem simples, direta e leve. Recomendável não apenas para quem acha que quer fazer jornalismo, mas sim para qualquer pessoa que se interesse pelos bastidores do jornalismo, e, consequentemente, pelos bastidores do poder. Noblat consegue neste livro, fazer o que ele sempre quis fazer:

"Tudo o que eu queria era escrever como se conversasse com um amigo calma e displicentemente, se possível deitado numa rede, olhando o mar de Porto de Galinhas... Aí, sim, talvez viesse a gostar do que escrevo. E, por gostar, entendesse por que insisto em uma tarefa que tanto me martiriza."
[página 88]

Faço minhas as palavras dele.

2 comentários:

Às favas todos os escrúpulos.

Estou aqui pra te julgar, Ana, premiar com o meu respeito o seu trabalho.

11 de fevereiro de 2009 às 17:29  

eu queria ser jornalista... mas aí eu tomei um café, e a vontade passou rs... já basta meu diploma que não uso

11 de fevereiro de 2009 às 18:23  

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